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"A crer pelas vezes em que se agitou o fantasma, muito se tem assinalado a preocupação de que Portugal se torne numa “república das bananas”. Ninguém previu foi que se transformasse num circo, e eis que caminhamos a passos largos para tal condição de palhaços tristes. O último indício foi o facto de um juiz ter constituído arguidos os jornalistas que publicaram no jornal “24 Horas” a notícia sobre o escândalo do Envelope 9. E é assim que se faz justiça neste país: em vez de se procurar saber quem e porquê nas instâncias judiciais andou a controlar os telefonemas dos principais agentes do Estado, resolveu-se incidir as baterias sobre os profissionais da informação que, no cumprimento do seu dever, denunciaram tais actos. A liberdade de expressão e de informação levou uma grande machadada, e este episódio, pelos vistos, é apenas o começo de um processo que escolheu os jornalistas como bodes expiatórios. A mensagem é muito clara: não se pode escrever nem falar sobre certas coisas. Se é de um golpe palaciano que se trata, e que de resto já teve como resultado no passado recente a decapitação do maior partido português, é melhor que nada se diga sobre tais tentativas, para que finalmente se faça tábua rasa da nossa Constituição e certos interesses subterrâneos se instalem em definitivo. A ironia de tudo isto é que, tal como nos tempos do marcelismo a música ganhou com o facto de a imprensa não ser livre, fugindo à censura devido às entrelinhas da boa poesia que se cantou (lembram-se dos magníficos discos pré-25 de Abril assinados por José Afonso e Sérgio Godinho?), talvez no futuro próximo os nossos autores de canções voltem a ter um decisivo papel de esclarecimento e mobilização. Ao menos isso, dado que agora os jornais só falarão de acidentes de automóvel e da vida dos famosos..."
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